domingo, 11 de novembro de 2012

30.11.2012 | Keane em Berlim sem Muro



Bastaria ter chegado às portas do Tempodrom duas horas antes da sua abertura para garantir um lugar na primeira fila da plateia, com relativa facilidade. A chuva miúda que se abateu sobre a cidade de Berlim durante toda a tarde talvez tenha contribuído para que a maioria esperasse pela proximidade do arranque do espetáculo para comparecer nas imediações do recinto.

Os que chegaram mais cedo iam metendo conversa uns com os outros, dando a conhecer as suas expetativas para a primeira apresentação de Keane na capital alemã desde 2009. Obviamente, não faltavam repetentes. Alguns divertiam-se a ver fotografias de Henry Walton, o guitarrista de Zulu Winter, que, nessa mesma manhã, havia cumprimentado os fãs ali presentes vestido com um robe de banho. Entretanto, apareceu alguém que afirmou ter sabido, diretamente através do pai de Tom Chaplin, que a banda se sentia esgotada, devido à exigência da corrente digressão. Espalhou-se o rumor de que, por esse motivo, os rapazes não permaneceriam em palco por mais de noventa minutos. Contudo, o eco súbito do refrão de She Has No Time, proveniente do interior da sala durante o teste de som, devolveu a esperança de um alinhamento satisfatoriamente extenso, com espaço para algumas surpresas.

Pelas oito horas da noite, entraram em cena os cinco elementos de Zulu Winter, que viriam a proporcionar um espetáculo de elevadíssima qualidade, à semelhança do que aconteceu no Porto ou em Lisboa. A passividade do público alemão, por repetidas ocasiões, levou o vocalista do grupo a solicitar mais entusiasmo aos presentes no Tempodrom, porém, sem grande sucesso. A verdade é que a exibição do quinteto britânico não foi minimamente afetada pela aparente apatia dos presentes, entre os quais se distinguiu Jesse Quin. O baixista fez questão de assistir a uma porção considerável da apresentação dos seus compatriotas, nas imediações do palco.

Os quatro elementos de Keane surgiriam perante os holofotes às vinte e uma horas em ponto, apostando num alinhamento muito próximo daquilo que tem sido habitual ao longo dos últimos meses. O início do concerto com You Are Young não foi tão explosivo quanto se adivinharia, já que o volume da música estava demasiado baixo [sendo ajustado mais tarde]. 

Desde logo, foi interessante observar que os fãs germânicos adotam uma postura surpreendente, pelo menos, para quem está habituado a assistir a concertos em Portugal: uns permanecem mudos e impávidos, ao passo que outros se limitam a fechar os olhos e a balançar a cabeça enquanto ouvem a música, aguardando até que todos os instrumentos se silenciem antes de desferir o aplauso de aprovação.

Numa tentativa de contrariar a timidez do público, Tom Chaplin foi assegurando a assistência de que, assim como os seus companheiros, se encontrava muito feliz por estar de volta a Berlim, evocando memórias saudosas de espetáculos de outrora naquela cidade. Perante a demora do público em aquecer, o vocalista acabaria por forçar claramente alguns elogios adicionais, afirmando que o Tempodrom é uma das melhores salas de concertos em todo o mundo ou que é sempre bom regressar à Alemanha, onde a banda gravou o melhor álbum da sua carreira – Perfect Symmetry

A melhor etapa do espetáculo seria inaugurada pelo anúncio de que estava prestes a ser tocado um tema retirado da gaveta durante a noite anterior, em Praga. Assim que Tom Chaplin disse que precisaria da ajuda de todas as senhoras na sala para cantar o refrão, não restaram dúvidas de que tinha chegado a hora de She Has No Time. A sétima faixa do álbum Hopes And Fears foi vigorosamente ovacionada e constituiu um dos momentos altos do concerto.

Entre duas visitas bem-aventuradas ao terceiro disco, Day Will Come surpreendeu pela sua popularidade junto do público. Afinal, havia muito mais gente que sabia a canção do início ao fim além de um pequeno aglomerado de fãs que, na fila para o Tempodrom, não parava de reproduzi-la no telemóvel. Apesar de Tim Rice-Oxley se ter enganado logo na primeira estrofe – o que lhe valeu uma valente careta de Tom Chaplin, que gerou algum desconforto nas primeiras filas da plateia – o tema mais enérgico de Strangeland foi também o melhor da noite.

Justifica-se uma nova paragem no alinhamento para falar de Hamburg Song, introduzida com algum humor pelo fato de o seu título não ser o mais apropriado para uma canção tocada em Berlim. Jesse Quin abandonou o palco durante a excelente prestação do trio que compunha originalmente a banda, numa espécie de viagem no tempo até aos dias de Under The Iron Sea, cuja turbulência continua a ser revivida nas palavras cantadas.

“Come on, Berlin! Let’s take it up to another level!” – com este mote lançado por Tom Chaplin, irromperia uma enxorrada de singles que, finalmente, fez o Tempodrom fervilhar, a ponto de não se ter verificado qualquer inibição na hora de se dar a vez ao público durante os refrões de Somewhere Only We Know e Bedshaped.

O primeiro regresso ao palco foi saudado com o arremesso de quatro rosas para o palco, uma para cada membro da banda. Foi, assim, num ambiente florido que os rapazes, mais uma vez, deram por concluída a sua missão de proporcionar um serão inolvidável a uma assistência que não arredou pé depois de Crystal Ball, parecendo saber de antemão que ainda haveria direito a um segundo encore, com uma versão de Under Pressure, originalmente interpretada por Queen e David Bowie.

Como notas finais, refira-se que a exaustão da banda é evidente. Não se assistiu a um único abraço entre os rapazes no centro do palco, mas, antes, a uma manifesta pressa em abandonar o mesmo. Tim Rice-Oxley cometeu erros em três canções consecutivas, sendo que, em circunstâncias normais, raramente falharia. A fadiga de Tom Chaplin foi indisfarçável, especialmente no início do concerto, além de o seu contato visual com as primeiras filas da plateia ter sido pobre, ao contrário do que é habitual. Talvez tenha sido a pensar no fato de que há uma semana de descanso entre as apresentações em Berlim e Hamburgo que o vocalista disse que o espetáculo no Tempodrom foi o seu favorito dentre todos aqueles que fizeram parte da digressão europeia até agora. (Quem esteve no Campo Pequeno ou no Coliseu do Porto sabe perfeitamente que não foi.)

Sem dúvida, nenhum outro álbum de Keane foi tão intensivamente apresentado ao público como Strangeland. O disco foi lançado apenas em Maio e, este ano, já foi tocado em mais de oitenta concertos, em dezenas de países diferentes. Foi, por isso, ainda mais impressionante assistir a uma atuação plena de profissionalismo por parte da banda, em Berlim, e observar a mestria com que derrubou o muro de apatia que o separava da plateia do Tempodrom, enfim rendido à supremacia musical que este grupo ostenta em todos os palcos que pisa.



Alinhamento:

You Are Young 
Bend And Break
On The Road
We Might As Well Be Strangers
Nothing In My Way
Silenced By The Night
Everybody's Changing
She Has No Time
The Lovers Are Losing
Day Will Come
Spiralling
A Bad Dream
Hamburg Song
Disconnected
Is It Any Wonder? 
This Is the Last Time
Somewhere Only We Know
Bedshaped

Sea Fog
Sovereign Light Café
Crystal Ball

Under Pressure (Versão de Queen e David Bowie) 


Por Strangelander


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